18 de janeiro de 2008

Do amor e do feitio



Nada como uma boa história de amor para nos deixar de bem com a vida. Isto a propósito de “The Quiet Man” – “O Homem Tranquilo”, de John Ford, que finalmente consegui ver esta semana, após anos de descuido cinéfilo. Neste excerto podemos ver duas das cenas mais marcantes do filme: um dos mais bonitos beijos da história do cinema, com John Wayne e Maureen O’Hara a esvoaçarem sem conseguirem resistir ao amor, e um pouco da cena final de pancadaria, das mais divertidas que me lembro de ver.
A visão de Maureen O’Hara a pastorear ovelhas num verde campo irlandês, com uma esvoaçante saia encarnada que explode num feérico Technicolor é de levar um homem a suicidar-se por amor a ela. A beleza desta mulher é tão indefinível como inultrapassável, conseguindo ao mesmo tempo ser inacessível e atractiva, terra-a-terra e aristocrática, doce e de péssimo feitio. Aliás, é mesmo o mau feitio desta personagem que a torna ainda mais desejável, mulher de têmpera e orgulho, de trato difícil. O bom feitio é algo agradável, importante para uma socialização tranquila e civilizada, mas nada como uma mulher impetuosa e complexa, de reacções inesperadas, para nos enlouquecer de facto e nos dar aquela, desculpem a expressão, pica necessária a qualquer relação. Gosto muito de gente branda e fácil, acho mesmo que resulta muito bem para a amizade, mas a paixão exige alguma tensão e para isto um certo mau feitio é necessário. Não é preciso ser um FDM (ver glossário), mas um bom excesso de personalidade já serve. Qualquer coisa que não nos deixe dormir sobre o amor. Que peça mais, que nos desperte mesmo que seja para gritar. Não pretendo defender o mau feitio como forma de estar, apesar da graça que pode ter, mas lá que uma mulher de mau feitio é outra coisa, lá isso é.